Faz parte do dia a dia do torcedor de futebol o uso de camisas, bonés, garrafas, capas de celular ou qualquer outro objeto que remeta ao seu clube do coração, no caso de Salvador, majoritariamente Bahia ou Vitória.

A demanda faz com que não só o time comercialize os chamados produtos originais - seja de forma própria ou licenciando a sua marca para outras empresas que pagam por este direito - como também vendedores "informais" o façam, produzindo e vendendo de forma independente, com produção em pequena escala.

Para o dissabor destes vendedores, quando não autorizada, a comercialização da marca do clube pode gerar processos judiciais dentro da Lei de Direitos Autorais, que determina como e quando as imagens referentes aos times podem ser transmitidas ou comercializadas. Para lidar com o caso, o Vitória foi um dos times brasileiros que firmou parceria com a Nofake, empresa especializada no segmento de proteção de marcas, que visa combater a chamada pirataria on-line.

Além do Rubro-Negro baiano, a empresa também tem como clientes equipes como o Palmeiras, o Cruzeiro e o Vasco. De acordo com a legislação vigente no Brasil, pirataria, ou seja, vender produtos sem autorização dos proprietários de uma marca é crime, e a pena pode chegar a quatro anos de reclusão e multa.

Através da Nofake, o Vitória vem notificando extrajudicialmente pessoas ou empresas que não estão licenciados para comercializar produtos com a marca do clube. De forma extrajudicial, a notificação não conta com a participação do Poder Judiciário, funcionando como uma abertura de conversa para negociações e acordos entre as partes envolvidas.

Mara dos Anjos, moradora do bairro de Castelo Branco, e dona do Ateliê Maerar, do ramo de moda praia, foi uma das pessoas notificadas por produzir artigos com a marca do Vitória. Mara confeccionou quatro tops e colocou à venda por R$ 45,00 cada, no marketplace, ferramenta de comércio do Facebook.

Após a ação da Nofake, a página on-line que Mara usava para vender os seus produtos foi suspensa e, segundo a microempreendedora, a empresa propôs o pagamento de um valor de R$ 1.500,00 para que Mara tenha a conta de volta e possa comercializar pela plataforma.

Recentemente, a artesã, que produz as peças em sua própria casa, divulgou o caso em seu Instagram.

Em conversa com o Bahia Notícias, Mara dos Anjos disse que muitas outras pessoas estão passando pela mesma situação. Ela já se considera punida a partir do momento que teve o seu perfil do Facebook bloqueado, perdendo fotografias e lembranças de mais de 10 anos de uso da plataforma.

Meu caso continua sem solução e vi que muitas pessoas estão passando pela mesma situação que eu. Pessoas que anunciaram brinquedos, lembrancinhas e botaram no marketplace e estão com a página bloqueada. A notificação não gera uma punição, mas eu já fui punida quando tive o meu Facebook bloqueado. Eu tenho a minha conta no Facebook há mais de 10 anos e, ano passado, comecei a usar o marketplace para divulgar meus produtos, disse Mara.

Ela também relatou não ter mais expectativa de recuperar a sua conta no Facebook e que não possui a quantia proposta pela Nofake.

Se eu criar uma conta nova, eu vou ser prejudicada porque o tempo que você tem na plataforma conta como credibilidade para convencer os clientes. Quando você liga para a Nofake, que representa o Vitória, eles propõem que você assine um documento com duas cláusulas e efetue o pagamento de R$ 1.500,00 para ter a conta de volta. É óbvio que eu não tenho R$ 1.500,00 para pagá-los. Se eu tivesse, iria pagar as minhas dívidas, comentou Mara.

Em seu site, a Nofake explica o passo a passo do que é preciso fazer após receber a notificação judicial.

Se você foi notificado extrajudicialmente é porque cometeu alguma infração contra a propriedade industrial das marcas as quais a Nofake representa, diz a empresa, que também recomenda o acordo extrajudicial para que não seja necessário ingressar com as medidas judiciais cabíveis.

A Nofake age como intermediadora entre possíveis infratores e vítimas de pirataria promovendo a composição do impasse de forma rápida e menos custosa às partes. Assim, o principal objetivo é regularizar a situação e assegurar o uso exclusivo da marca aos parceiros oficiais da Nofake, de modo que recomendamos a formalização do acordo extrajudicial a fim de que não seja necessário ingressar com as medidas judiciais cabíveis, diz a empresa.

O diretor do Departamento Jurídico do Vitória, Antonio Boaventura, disse que a Nofake foi contratada para que seja fiscalizado "o uso indevido da marca do clube" e que se a pessoa quiser confeccionar qualquer tipo de produto "tem que entrar em contato com o clube e solicitar a autorização".

Trata-se da Lei de Direitos Autorais. O Vitória é detentor dos seus direitos e para que alguém use a marca do clube é preciso que o mesmo autorize. Foi contratada uma empresa para que proíba o uso indevido da marca do clube. Há muitas situações em que as empresas produzem copos, bonés, sem autorização. Sobre um amparo legal, a Nofake faz essa fiscalização para evitar a utilização indevida. Se a pessoa quiser confeccionar, tem que entrar em contato com o clube e solicitar a liberação, comentou Antônio Bonaventura.

Na última quinta-feira (1º), o Vitória lançou a sua nova terceira camisa para a temporada 2024. Produzida pela Volt, a camisa custa R$ 279,99 e pode ser comprada on-line (lojasounego.com.br). Para o advogado Diego Assis, é inevitável que o Vitória precise ser coercitivo na defesa da sua marca, porém microempreendedores, como Mara dos Anjos, não tem poder para causar prejuízo econômico ao clube.

É inevitável dentro de uma lógica de valorização da sua marca que o Vitória precise ser coercitivo com pessoas que utilizam dos seus símbolos para ganhar dinheiro. Ao mesmo tempo que essas pessoas, que produzem, por exemplo, cinco camisolas com o escudo do Vitória em um mês, não tem poder para causar prejuízo econômico no clube, disse Diego, que lembrou como já existem empresas licenciadas pelo clube e que podem existir outras formas de licenciamento aos microempreendedores.

Não faz sentido para empresas que licenciam produtos com o Vitória, que paguam por esse licenciamento, disputem concorrência com quem não paga e vende o produto imensamente mais barato. Dentro desta lógica, o Vitória tem o direito de resguardar os seus parceiros e a rubrica de licenciamento como algo que tenha certa representatividade dentro do seu orçamento. Porém, o clube poderia estar buscando esses microempreendedores para fazer uma espécie de licenciamento diferente, onde você não causa um dano ao clube nem cria uma algum tipo de embate com esse microempreendedor, garantindo a ele o poder de continuar produzindo e vendendo as suas peças, com menor valor agregado e também que o clube ganhe alguma coisa com isso, afirmou Diego Assis.

E as camisas da shopee?

Por fim, o advogado ainda destacou o crescimento das multimarcas asiáticas, que produzem réplicas das camisas oficiais de futebol e comercializam em sites como a Shopee, por exemplo. Na leitura de Diego, o Vitória está pressionando esses microempreendedores para intimidar este outro tipo de pirataria, que impacta de fato no orçamento do clube.

O maior produto de valor agregado que um clube produz e vende são as camisas, o enxoval. Nos últimos tempos, com o advento das multimarcas chinesas, tailandesas, etc, que produzem réplicas das camisas de futebol com uma qualidade considerável e uma semelhança incrível, nós vimos uma enorme quantidade dessas camisas nas ruas com qualidades parecidas e com valor agregado muito menor. Isso sim representa um impacto significativo no clube. Acho que o Vitória está pressionando esses microempreendedores, que produzem artigos com o escudo do time, para intimidar essas outras pessoas que produzem e vendem camisas não licenciadas, porque o enxoval é muito mais caro e tem um apelo muito maior na lógica de mercado. Eu acho que você não consegue fugir da pirataria se você vende uma camisa de futebol a R$ 350,00 em um país como o Brasil, finalizou.

Fonte: G1 / Foto: Victor Ferreira

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