Em meio ao anúncio de mais um reajuste nos preços de combustíveis pela Petrobras, integrantes do governo Jair Bolsonaro (PL) trabalham em uma minuta de projeto de lei para tentar avançar na discussão da privatização da companhia.
A avaliação entre defensores da medida é que os aumentos anunciados pela empresa estão criando um ambiente político favorável ao tema no Legislativo. O envio do projeto também poderia alimentar o discurso do governo de que está agindo para solucionar o problema.
Segundo fontes do governo ouvidas pela reportagem, um dos modelos analisados para a operação é a conversão de ações preferenciais da companhia (priorizadas na distribuição de dividendos, mas sem direito a voto) em ações ordinárias (com direito a voto na assembleia de acionistas).
Apenas essa transação já seria suficiente para diluir a participação da União na empresa. Com isso, o controle da companhia passaria para as mãos da iniciativa privada.
A minuta do projeto de lei diz que a Petrobras fica "autorizada a converter todas as suas ações preferenciais em ações ordinárias, na forma da legislação societária".
O aval do Congresso Nacional é necessário porque a Lei do Petróleo, de 1997, proíbe o governo de se desfazer do controle sobre a Petrobras.
No entanto, há quem veja dificuldades de o Congresso conseguir avançar em um tema tão polêmico em ano eleitoral. O próprio Bolsonaro já admitiu publicamente que a privatização da companhia pode levar até quatro anos.
Além disso, o primeiro colocado nas pesquisas de intenção de voto para o Palácio do Planalto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é contra qualquer tentativa de privatizar a Petrobras.
A empresa foi incluída no PPI (Programa de Parceria de Investimentos) pelo governo no início de junho, após o novo ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, prometer, logo em seu primeiro discurso, a realização de estudos para a privatização da companhia.
O primeiro anúncio foi feito em um momento de fortes críticas de Bolsonaro à política de preços da companhia, contexto que se repete agora diante do novo reajuste aplicado pela petroleira. A alta nos combustíveis é vista por aliados do presidente como o maior obstáculo à sua reeleição.
A conversão das ações é considerada a principal opção para a proposta de privatização da companhia, mas ainda não houve uma decisão final. Outras alternativas seriam a União vender parte de suas ações ordinárias, ou ainda realizar uma capitalização, com emissão de novas ações, a exemplo do que foi feito no caso da Eletrobras.
Qualquer modelo precisará passar pelo crivo das áreas jurídicas do governo e também do TCU (Tribunal de Contas da União).
Além do projeto de lei autorizando a conversão das ações, a medida também demandaria uma mudança no estatuto da Petrobras. Tanto a Lei do Petróleo como o estatuto dispõem sobre a divisão do capital social da companhia em ações ordinárias e preferenciais.
A Petrobras tem hoje 13 milhões de ações negociadas em mercado, sendo 7,4 milhões ordinárias e 5,6 milhões preferenciais.
No caso das ações com direito a voto, a União tem o controle, com 50,26% de participação. Já nas preferenciais, a fatia do governo federal é menor, de 18,48% —essas ações estão na carteira do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Com isso, a parcela da União no capital total da empresa é de 36,61%, o que ilustra a perda de controle em caso de uma conversão integral das ações.
Segundo uma das fontes ouvidas, o projeto de lei em elaboração no governo também deve trazer alguns antídotos para que a operação não signifique uma mera troca do controle estatal por um monopólio privado.
Os detalhes dessas medidas ainda estão em discussão entre os técnicos, mas o diagnóstico é que a Petrobras é praticamente monopolista no mercado de refino, prejudicando a concorrência e permitindo a prática de preços mais elevados na venda de combustíveis.
Embora o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) já tenha atuado no tema, com um acordo em 2019 para que a empresa se desfaça de oito refinarias, o cronograma de venda desses ativos está atrasado.
Em meio às discussões sobre o projeto de lei, há uma preocupação dentro do governo de deixar claro para todos os envolvidos que esse modelo de privatização não vai, em um primeiro momento, gerar novas receitas para a União.
Essa apreensão existe porque o ministro da Economia, Paulo Guedes, já manifestou em diferentes ocasiões o desejo de usar os valores obtidos com a operação para abastecer um fundo de combate à pobreza.
A única forma de o governo arrecadar recursos com a privatização seria com a venda de suas ações, o que, segundo pessoas que participam das negociações, não deve fazer parte do plano em um primeiro momento.
No futuro, porém, a aposta é que as ações da companhia privatizada tenham uma valorização em relação aos preços atuais, favorecendo a União em uma eventual venda.
Por Folhapress
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