No dia 14 de julho de 2020, os argentinos enfrentavam uma rígida quarentena obrigatória determinada por decreto presidencial. Não era possível realizar reuniões particulares, viajar nem ir a bares e restaurantes, que estavam fechados. Apenas trabalhadores considerados essenciais podiam andar a mais de 500 metros de suas casas, e veículos que circulavam sem autorização eram retidos e multados.

Na Quinta de Olivos, a residência presidencial, porém, outra coisa ocorria. O presidente Alberto Fernández recebia, para comemorar o aniversário da primeira-dama, Fabíola Yañez, um grupo de 12 pessoas, em torno de uma mesa com bolo, vinho e comida. Ninguém usava máscaras nem respeitava o distanciamento social. E o grupo não se esqueceu de registrar o evento, sorrindo para uma foto.

Mas, no início do mês, um escândalo se armou na Argentina quando essa imagem veio à tona. Na quinta-feira (12), os deputados opositores Mario Negri, Luis Petri, Waldo Wolff e Cristian Ritondo apresentaram um pedido de julgamento político do mandatário por descumprir seu próprio decreto. Nesta sexta-feira (13), a Justiça argentina comunicou que vai investigar o caso.

O escândalo debilita o governo quando a Argentina está a três meses da eleição legislativa que renovará o Congresso. 

Depois de dias de silêncio, o governo se pronunciou sobre o caso. "É preciso esclarecer que Olivos estava funcionando como um centro de operações do governo no começo da pandemia, e muita gente entrava e saía", explicou o chefe de gabinete, Santiago Cafiero, que minimizou o fato de a primeira-dama ter celebrado seu aniversário com amigos nessa época. "É evidente que houve um descuido, mas está sendo feito um uso político disso que não é proporcional ao erro", completou, em entrevista a uma rádio local.

A foto foi revelada pelo jornal La Nación e viralizou nas redes. Na imagem, estão pessoas que não entravam na classificação de "trabalhador essencial". Havia corretores de imóveis, ex-modelos, atrizes, além da estilista e do cabeleireiro de Fabíola. Havia, ainda, uma criança acompanhando os pais. O presidente aparece na foto sorridente e relaxado.

O procurador Ramiro González afirmou nesta sexta-feira que abriu investigações para determinar se houve descumprimento da quarentena naquela noite e em outras em que as planilhas de entrada e saída da Quinta de Olivos, também divulgadas pela imprensa, registravam entrada e saída de pessoas.

Podem ser considerados delitos, cometidos pelo casal presidencial, o descumprimento do decreto que restringia a circulação e atentado contra a saúde pública. A pena varia de seis meses a dois anos de prisão.

O caso fica mais grave porque, antes dessa foto, havia vindo a público uma outra que mostra a primeira-dama com poucos amigos --nessa o presidente não aparece.

Naquele momento, Fernández afirmou que a imagem poderia ter sido alterada, de forma a parecer que a reunião tinha acontecido durante a quarentena e na residência oficial.

O presidente chamou de mentirosas as acusações de que tivesse havido uma festa e disse que mantinha apenas reuniões de trabalho. "Em Olivos, me cansei de ver gente, mas por trabalho, porque sou o presidente da República."

Com a segunda foto, no entanto, em que ele aparece descontraído com os convidados e até seu cachorro Dylan, a primeira negação soa como uma mentira descarada. Fernández não disse nada sobre a segunda imagem até o meio da tarde desta sexta.

Por Sylvia Colombo / Folhapress

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