Militares venezuelanos abriram fogo contra um grupo de civis que tentava ajudar a manter aberta a fronteira da Venezuela com o Brasil na manhã desta sexta-feira (22). Ao menos duas pessoas morreram. O ditador Nicolás Maduro ordenou o bloqueio da fronteira entre os dois países na noite de quinta-feira (21), para impedir a entrada de ajuda humanitária no país.
O confronto ocorreu em uma vila de Kumarakapay, na Venezuela, que fica ao lado de uma estrada. Um grupo indígena tentou parar um comboio militar que se dirigia à fronteira com o Brasil, em um dos pontos onde o governo Maduro pretende barrar a entrada de ajuda humanitária. Os soldados entraram na vila, abriram fogo contra as pessoas, liberaram o caminho e seguiram em frente.
"Uma mulher indígena e seu marido morreram e ao menos outros 15 membros da comunidade indígena do município Gran Sabana ficaram feridos após a investida de um comboio da Guarda Nacional", informou à AFP a ONG Kapé Kapé. De acordo com o jornal El Nacional, ao todo 22 pessoas ficaram feridas no confronto.
Apesar do bloqueio, duas ambulâncias venezuelanas cruzaram a fronteira brasileira para levar cinco feridos a um hospital de Roraima. "Neste momento, cinco pacientes venezuelanos estão sendo atendidos no Hospital Geral de Roraima. Todos foram feridos por arma de fogo", disse a Secretaria Estadual de Saúde, em nota.
Após o ataque, ao menos 30 moradores dos arredores da vila sequestraram três funcionários do governo. Segundo Tamara Suju, advogada e defensora dos Direitos Humanos, eles só serão liberados pelos indígenas caso o ministro da Defesa da Venezuela, Padrino López, vá buscá-los pessoalmente.
Os ativistas que fizeram o bloqueio pertencem ao grupo indígena Pemones, que se uniu ao esforço da oposição venezuelana para ajudar a receber a ajuda humanitária enviada pelos EUA.
O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, condenou "energicamente" o ataque contra a comunidade. "Exigimos o fim dos ataques contra as populações", segundo um comunicado postado em redes sociais.
O líder opositor Juan Guaidó, reconhecido por 50 países (incluindo o Brasil) como presidente interino, se comprometeu a fazer chegar "de uma forma ou de outra" a ajuda humanitária ao país a partir de diversos pontos na fronteira, neste sábado (23).
Em uma postagem no Twitter, Guaidó enviou solidariedade às vítimas e prometeu que o caso "não ficará impune". Ele pediu que os responsáveis pelos disparos sejam capturados e entregues por seus superiores.
O envio de ajuda para os venezuelanos que sofrem com a crise econômica se tornou um foco de luta de poder entre Maduro e Guaidó. O ditador teme que a entrega seja um disfarce para facilitar uma intervenção dos Estados Unidos, e ordenou aos militares que impeçam a entrada dos mantimentos, enquanto o opositor pede ao Exército que libere a passagem dos carregamentos. As Forças Armadas seguem leais a Maduro.
Os Estados Unidos dizem que 'todas as opções estão sobre a mesa' e, nos últimos dias, têm pressionado o Brasil para que o país use força militar para entregar ajuda humanitária à Venezuela.
A área de Defesa brasileira resiste à ideia por temer que a situação escale para um conflito, e também vetou a sugestão de que soldados americanos participassem da operação.
Nesta sexta, a Rússia acusou os Estados Unidos de usar a ajuda humanitária enviada à Venezuela como "um pretexto para uma ação militar" para derrubar o presidente Nicolás Maduro.
"Há informações de que empresas norte-americanas e aliados dos Estados Unidos na Otan estudam a compra de uma importante quantidade de armas e munições de um país do leste da Europa, com o objetivo de entregá-las para as forças de oposição da Venezuela", disse Maria Zajarova, porta-voz da diplomacia russa.
A China também questionou a entrega de comida e remédios. "Se a chamada ajuda humanitária chegar a ser enviada à força para a Venezuela, poderá desencadear um conflito e provocar graves consequências", disse Geng Shuang, porta-voz do ministério de Relações Exteriores da China. "Isso é o que ninguém quer ver."
Fonte: Folha de S. Paulo / Fotos: Ricardo Moraes/Reuters