Insatisfeitas com o preço dos combustíveis e a queda de faturamento dos caminhoneiros, algumas entidades voltaram a falar em paralisação neste começo de setembro. Entenda o que está na origem dessa crise e daquela que parou as estradas entre maio e junho deste ano.
Vai haver nova paralisação de caminhoneiros? Não é possível afirmar que vai haver paralisação. Neste sábado (1º), a UDC (União dos Caminhoneiros do Brasil), uma das entidades que reúnem transportadores no país, publicou nota afirmando que faria mobilização após o feriado da Independência (dia 7 de setembro), por tempo indeterminado.
O setor, porém, não tem lideranças centralizadas. São mais de 500 mil transportadores no país, dos quais quase 400 mil são caminhoneiros autônomos e cerca de 300, cooperativas.
O uso das redes sociais descentraliza a comunicação e as decisões. Em 2016, 66% dos caminhoneiros usavam internet pelos smartphones, segundo os dados mais recentes, da CNT, mas a penetração cresceu desde então.
Há outras entidades falando em greve?
Gilson Baitaca, líder do Movimento dos Transportadores de Grãos, de Mato Grosso, falou em "risco de novas paralisações" se a ANTT não se posicionar até o dia 7 ou 8 de setembro sobre a nova tabela de fretes, que, segundo ele, não está sendo cumprida.
A Abcam, entidade que reúne os motoristas autônomos, afirmou neste sábado (1º) que é totalmente contrária a novas manifestações e que pretende se reunir com o governo para discutir a crise do setor.
Na sexta e no sábado, circularam em aplicativos de trocas de mensagens áudios, cuja autenticidade não foi comprovada, convocando para novas paralisações.
Um complicador é que não há linha direta entre caminhoneiros autônomos e seus "representantes".
Os primeiros acordos, feitos durante a paralisação de maio, foram assinados pela Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Confederação Nacional do Transporte (CNT), Federação dos Caminhoneiros Autônomos de Cargas em Geral do Estado de São Paulo (Fetrabens) e outros sindicatos. A Abcam abandonou as reuniões.
Apesar das reuniões das entidades com o governo e das assinaturas, motoristas se disseram não representados, e o movimento só foi encerrado vários dias depois.
O que levou às novas reclamações?
Entidades dizem que o governo não cumpriu o prometido em relação ao preço do diesel. O governo anunciara redução de R$ 0,46 por litro nas bombas de combustível -R$ 0,30 de subsidio mais R$ 0,16 de cortes de impostos. Entre a primeira semana de greve, em maio, e a semana passada, a queda foi de R$ 0,41 por litro, segundo dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis).
Caminhoneiros reclamam também de que as empresas não estão pagando o frete mínimo estabelecido por lei editada após a paralisação de 11 dias entre maio e junho do ano passado.
Outra queixa é a de que falta de fiscalização nas estradas pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).
O que aconteceu com o preço do diesel?
Na sexta-feira (31), o combustível teve reajuste de 13%, por causa da alta do dólar, entre outros.
O reajuste varia por região: será maior na região Centro-Oeste (14,4%) e menor na Sudeste (10,5%).Pelos próximos 30 dias, o preço médio do diesel vendido pela Petrobras sobe para a R$ 2,2964 por litro, apenas R$ 0,0752 abaixo do recorde atingido no dia 23 de maio, ainda no início dos protestos dos caminhoneiros.
Segundo a Petrobras, o aumento nas bombas deve ficar em 7%.
Alta acima de 10% no preço do combustível deveria levar a revisão dos pisos estabelecidos para os fretes pela nova lei, aprovada após a paralisação de 11 dias em maio deste ano.
O governo pode segurar o preço do combustível?
O Ministério de Minas e Energia negou nesta sexta (31) a possibilidade de aumento do subsídio.Segundo o órgão, já foram colocados R$ 9,5 bilhões no programa de subvenção e não há recursos para elevar esse gasto.
O que diz a nova lei sobre os fretes?
A lei sancionada no começo de agosto institui valores mínimos de fretes rodoviários praticados no Brasil.
O presidente Michel Temer vetou o artigo que anistiava multas de trânsito e sanções judiciais aplicadas aos caminhoneiros durante a paralisação da categoria, em maio e junho.
A lei é criticada pelos clientes das transportadoras e pelas grandes empresas do setor, que reclamam de ineficiência e alta de custos.
Em junho, a Associação do Transporte Rodoviário de Cargas do Brasil (ATR), que representa as empresas transportadoras, entrou no STF (Supremo Tribunal Federal) com uma ação para suspender os efeitos do tabelamento de preços de fretes rodoviários.
A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) também entrou com um pedido no STF contra a tabela.
Quais as raízes da crise dos caminhoneiros?
Por causa da recessão, o volume de carga (principalmente da indústria e do comércio) caiu, prejudicando as contas dos 2,6 milhões de caminhoneiros –374 mil autônomos, segundo a CNT (confederação do setor).
Os caminhões brasileiros trafegam com 61% de sua capacidade, e 39% das viagens são de veículos vazios, mostrou pesquisa da Empresa de Planejamento e Logística (EPL) feita em 2014.
Programa de incentivo à compra de veículos aumentou muito o número de caminhões nas estradas, elevando a oferta de transporte e reduzindo os preços.
Caminhoneiros também se queixam dos fretes "de retorno". Cientes de que muitos caminhoneiros precisam voltar para a região Sudeste, empresas oferecem valores muito baixos por esse trecho da viagem.
Para especialistas em transporte rodoviários, há também desequilíbrios estruturais no setor, como a ineficiência no uso do combustível e a falta de incentivo em transporte multimodal.
Por que a paralisação de caminhoneiros afeta rapidamente o país?
No Brasil, 90% do transporte de passageiros e 60% do transporte de cargas é feito por rodovias, de acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Há cerca de 400 mil caminhoneiros autônomos no país, responsáveis pelo transporte de 40% das cargas. As empresas, cerca de 100 mil, transportam cerca de 60%.
Manifestantes também têm feito bloqueios em pontos estratégicos, como a saída de refinarias da Petrobras e a entrada do porto de Santos, em SP, dificultando ainda mais o escoamento das mercadorias.A greve provocou desabastecimento e fez a inflação dobrar em maio.
Com informações da Folhapress