Em meio à dificuldade para equacionar a delicada situação fiscal, alguns estados vão ter que encarar mais uma fonte de dor de cabeça: a forte valorização do dólar nas últimas semanas e os seus efeitos sobre o endividamento em moeda estrangeira.
De janeiro até terça-feira (15), a dívida externa total dos estados cresceu R$ 15,1 bilhões. Ela saiu de R$ 97 bilhões e atingiu R$ 112,1 bilhões, segundo estimativas feitas com base em dados do Banco Central e no comportamento do dólar.
Apenas na terça-feira (15), dia em que o dólar chegou ao maior nível desde abril de 2016, cotado a R$ 3,66, o endividamento externo dos estados subiu R$ 1,2 bilhão.
A nova fonte de tensão não atinge de maneira uniforme todos os estados, mas acerta justamente os governos menos endividados -pelo menos até o fim do ano passado.
Se os governos regionais com grandes volumes de dívida tivessem boa parte dela em moeda estrangeira, o estrago poderia ser muito maior.
Entre os estados, o mais comprometido é o Amazonas, onde o endividamento externo cresceu 25 pontos percentuais entre 2016 e 2017, alcançando 50% da dívida consolidada de pouco mais de R$ 6,2 bilhões. O levantamento com base em dados do Tesouro foi feito por Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas.
Completam o grupo do estados mais endividados em dólar o Ceará (49% de uma dívida de quase R$ 12 bilhões); Pernambuco (43,5% da dívida de R$ 14,7 bilhões); Piauí (42,6% de uma dívida total de R$ 5 bilhões); e o Acre, com 40,8% da dívida em outras moedas.
"Os números mostram que os estados mais expostos às flutuações da moeda americana são aqueles com baixo endividamento. Esse é o grupo que está vendo a dívida aumentar", diz Vilma Pinto.
Para ela, esses estados devem conseguir lidar melhor com o aumento justamente porque têm as suas contas um pouco mais em ordem.
Por outro lado, os estados com as contas mais problemáticas devem sofrer menos os efeitos do dólar mais alto, pois reduziram o endividamento externo entre 2016 e 2017.
No Rio de Janeiro, a dívida em moeda estrangeira caiu mais de 20 pontos em 2017, ou apenas 8,6% da dívida consolidada, de R$ 137 bilhões.
Minas Gerais seguiu o movimento: com queda de 12 pontos, a dívida externa caiu para 11% do endividamento total, de R$ 109 bilhões. Assim como no Rio Grande Sul, em que a dívida externa é 9,4% da dívida total, de R$ 76,7 bilhões -um recuo de 9 pontos.
O aparente paradoxo ocorre, segundo especialistas, porque os governos mais saudáveis vêm se aproveitando do movimento de expansão dos limites de financiamento de bancos internacionais para o Brasil desde 2011.
Isso conjugado ao ambiente de alta da liquidez externa fez com que estados e municípios substituíssem dívidas mais caras pelos juros mais baixos de empréstimos oferecidos pelo Banco Mundial ou pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento.
Pernambuco, por exemplo, viu sua dívida externa subir mais de 13 pontos em 2017.
Mas mesmo com a alta do dólar, diz o secretário da Fazenda de Pernambuco, Marcelo Barros, o financiamento na moeda americana segue mais atraente devido às baixas taxas de juros externas.
Além disso, diz, muitos contratos têm salvaguardas contra desvalorização de moedas que podem ser acionadas se o governo entender necessário.
Raul Velloso, economista especializado em finanças públicas, diz que, no desespero para obter recursos, o ponto de preocupação é que os estados não devem fazer análise muito sofisticada das operações afetadas pela câmbio.
"Nos últimos anos, com a situação cambial mais tranquila e diante da fartura de recursos do exterior, esses estados se aproveitaram, mas não creio que eles, em especial os mais pobres, estejam preparados para lidar com isso", diz.
Para Velloso, diante dificuldade para equacionar o caixa, o endividamento em dólar deve ser o último problema a receber atenção dos estados.
Com informações da Folhapress