Uma infecção na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Geral Roberto Santos (HGRS), em dezembro do ano passado, obrigou a comissão de controle de infecções hospitalares da unidade a tomar uma medida drástica. O descarte de colchões velhos, diretamente ligado à presença de bactérias, provocou a redução de leitos disponíveis nos diversos setores da unidade.
[caption id="attachment_51524" align="aligncenter" width="620"] Camas sem colchões em área infectada por super bactérias (Foto: Alexandre Lyrio / CORREIO)[/caption]
Funcionários da unidade confirmaram que a diminuição do número de leitos ocorreu devido à falta de colchões para repor os que foram descartados durante o processo de desinfecção. Tanto o Sindicato dos Trabalhadores em Saúde da Bahia (Sindisaúde) quanto o Sindicato dos Médicos da Bahia (Sindimed-BA) confirmaram a existência do surto, já controlado. Ambos afirmam que foi causado pelas bactérias multirresistentes KPC e Cianobacter.
O hospital não soube informar quantos colchões foram descartados. Tiveram que ser jogados fora todos aqueles que estavam danificados, muito velhos ou rasgados, já que poderiam facilitar a proliferação de bactérias. A reportagem teve acesso a parte das dependências do hospital. Nas enfermarias e na emergência, confirmamos o problema e registramos imagens de leitos de, pelo menos, seis quartos de enfermarias sem colchões.
Trouxe de casa
O HGRS possui 114 leitos de emergência, 336 de enfermarias, 14 de Unidades Intermediárias (UAVC) e 93 de UTIs. O CORREIO apurou que a diminuição foi de 16 leitos na enfermaria de Infectologia para 3 leitos. No setor de endocrinologia, a redução foi de 8 leitos para 1 e no setor de clínica médica foi de 32 leitos para cerca da metade. Na emergência, o problema se repete.
“Vi algumas macas vazias no corredor sem colchão. Como não tinha maca, em dias mais cheios chegamos a ter que atender pacientes no chão ou na cadeira”, apontou uma funcionária da emergência. Ali, outro flagrante confirmou o que disse a funcionária. Registramos imagens de um paciente que chegou a levar um colchão de casa, alugou uma maca e, sem leito, passou a noite no chão.
O autônomo Adinailton de Jesus Pereira, 46 anos, chegou com dores de coluna e usou um colchão dele próprio para se acomodar no chão da recepção do Roberto Santos. Abaixo do colchão, uma maca alugada pela família. “Ele tem uma fratura na coluna e precisa de cirurgia. É um absurdo a pessoa chegar nesse estado e não tem nem onde deitar”, protestou a sobrinha de Adinailton, Laiza Nery Santos. Somente na manhã seguinte, o paciente foi colocado em uma sala improvisada.
[caption id="attachment_51525" align="aligncenter" width="620"] Paciente dorme em corredor em colchão levado de casa (Foto: Alexandre Lyrio / CORREIO)[/caption]
Relatos
Sem se identificar, inúmeros funcionários de diversos setores confirmaram o problema. “Soube que teve um surto infeccioso no hospital e foi necessário remover os colchões. Como foram muitos jogados fora, não conseguiram repor a tempo e ficou um período com poucos nas enfermarias. Eles estão reabastecendo aos poucos. Priorizam os locais mais emergenciais como as UTIs, de cirurgia, os locais mais delicados”, aponta uma funcionária. Outra funcionária também confirma que houve diminuição temporária de leitos desde meados de dezembro, quando começou o processo de troca dos colchões.
Apesar dos relatos, o hospital negou a existência de um surto de bactéria. Em nota, a assessoria de comunicação da unidade informou que a troca de colchões é um procedimento programado e preventivo, que tem o objetivo de evitar o surgimento de possíveis infecções hospitalares, aproveitando a baixa demanda de cirurgias eletivas (que não são emergenciais) nos meses de dezembro e janeiro. O hospital garante que não houve alteração na assistência e nenhum paciente deixou de ser admitido.
“A nossa Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) atua de maneira preventiva o ano todo. Em 2016, iniciamos um projeto-piloto para eliminação de bactérias multidrogarresistentes na UTI da Emergência e, logo em seguida, o trabalho seguiu por todo o hospital. Não houve surto. Essa é uma medida exatamente para acabar com as possíveis infecções”, diz nota divulgada pela instituição. A estimativa, segundo a assessoria, é de que em 30 dias a substituição seja concluída.
Contestação
Contrariando as informações oficiais do hospital, a secretária-geral do Sindisaúde, Inalba Fontenelle, revela que a troca de todos os colchões foi motivada, sim, pela infecção. “Foi confirmada a existência de uma superbactéria no hospital, mas ela está controlada. A substituição já foi concluída na UTI e no Centro Cirúrgico. Nesses casos, o colchão que estiver danificado, rasgado, tem que ser trocado, mesmo que nenhum paciente o tenha usado”, afirmou.
O vice-presidente do Sindimed-BA e médico do HGRS, Luiz Américo, conta que o processo de desinfecção ocorreu no mês de dezembro. “A infecção já tinha alguns meses. No fim do ano, resolveram tomar medidas mais drásticas para combater as bactérias. Fizeram uma limpeza geral, uma pequena reforma da UTI e queima de alguns colchões. Depois disso, o problema foi controlado”, afirmou.
Espera
A falta de leitos piorou a situação de quem espera por uma vaga de internamento e até de quem está internado. Uma senhora aguardava na porta do hospital a chegada de um carro particular para levar o irmão para casa. Operado de apendicite no último domingo, ele estava internado no leito pré-cirúrgico porque não havia vagas na enfermaria. Como consequência, ele não pode receber visitas durante a recuperação.
Parentes de uma mulher que está internada no primeiro andar também estranhou os leitos vazios. “Eu rodo esse hospital todo. O segundo andar está quase todo sem colchão. O terceiro tem duas enfermarias fechadas, sem uso. Deve ser esse problema dos colchões”, sugeriu.
O pai de um bebê, que acompanha a criança na enfermaria de pediatria, nos contou que viu duas camas da enfermaria da segunda ala sem colchão e que, na terceira ala, onde seu filho está internado, faltam cadeiras para acompanhantes.
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