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Não resta dúvida sobre a determinante participação de inaceitáveis descuidos com fatores de ordem hidráulica e geotécnica entre as causas essenciais do rompimento de duas barragens de rejeitos da Samarco (Vale + BHP Billiton) no município de Mariana (MG). Esse episódio vai tragicamente se consagrando como um dos mais graves desastres em obras da engenharia brasileira.


Tragédia em Mariana mostra que barragens de rejeito são bombas armadas


No entanto, há um fator importantíssimo que não vem sendo considerado com relação à inadmissível ausência, por parte da empresa, de procedimentos inerentes a um plano de gestão de riscos. Uma barragem, por maiores e mais confiáveis que sejam os cuidados com sua segurança, será sempre uma bomba armada. As áreas do vale a jusante das barragens, que teoricamente pudessem ser atingidas pelas águas e detritos liberados por uma eventual ruptura, devem ser sempre consideradas na classificação internacional de riscos como de muito alto perigo (risco 4, o mais elevado).


Esse nível de preocupação com as áreas a jusante de barragens foi especialmente aguçado após a catástrofe de Banqiao. Em agosto de 1975, na província de Henan, na China, ocorreu um dos mais graves e espetaculares acidentes em obras e engenharia da história humana. Os rompimentos das barragens de regularização de cheias de Banqiao, no rio Ru, e Shimatan, no rio Hong, provocaram a morte de mais de 230 mil pessoas, sendo 145 mil diretamente e 85 mil em consequência de uma série de desgraças que se seguiram (fome, falta de atendimentos de emergência, doenças etc.).


Com isso, salta aos olhos o absurdo da inexistência de um plano de gestão de riscos que levasse em consideração as atividades humanas e os fatores ambientais no vale atingido em Minas Gerais, com especial atenção para a ocupação urbana representada pelo distrito de Bento Rodrigues.


Se houvesse atenção para esses cuidados, há muito, a empresa Samarco deveria ter providenciado a desocupação das áreas potencialmente mais vulneráveis, com o deslocamento de seus ocupantes para áreas próximas seguras. Essas áreas então desocupadas, que coincidem hoje com a mancha de lama que pode ser vista em imagens aéreas pós-rompimento, seriam então utilizadas para funções de baixa presença humana, como bosques florestados e parques. Ou seja, é inaceitável que nessas regiões de extremo risco tenha-se convivido durante todo esse tempo com a instalação urbana de residências, escolas, comércio etc.


Da mesma forma, chama a atenção a ausência de um plano de contingência no qual cada cidadão saberia de antemão como agir ante qualquer evidência de acidente com a barragem.


De imediato, talvez essa seja a maior lição que situações similares que se espalham por todo o território brasileiro possam tirar do doloroso desastre de Mariana: com a maior urgência possível, é preciso estruturar planos de gestão de riscos que, por determinações de caráter preventivo de relativamente fácil implementação, possam ao menos evitar que vidas humanas sejam tão gratuita e estupidamente ceifadas.


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